Tecnologia na educação: Métodos para não utilizar

Num passado não muito distante o foco do uso de tecnologia na educação era apresentação do conteúdo em sala de aula. O uso de aparelhos retroprojetores de transparência (quem nunca?!) cedeu lugar a televisores acoplados a videocassetes que, por sua vez, foram substituídos por computadores ligados a projetores para reprodução dos famigerados slides de powerpointTodos esses recursos tinham como objetivo apoiar o professor na exposição do conteúdo, ou seja, serviam como ferramentas para o docente ensinar melhor.

Com a ampliação do acesso à internet, e a disseminação dos dispositivos móveis (e seus milhares de aplicativos) entre alunos e professores, houve uma quebra de paradigma. O desafio agora passa a ser a utilização de novas tecnologias para promover formas de os alunos aprenderem melhor. Embora haja uma clara área de intersecção e dependência entre ensinar melhor e aprender melhor, há também diferenças nesses dois processos que precisam ser levadas em consideração. Apenas ensinar melhor não basta.

É preciso fornecer aos alunos caminhos para que eles aprendam melhor, a partir de recursos que permitam não apenas uma melhor exposição de conteúdos, mas também a interação e a personalização, de acordo com suas necessidades individuais.

Neste artigo, vou listar 5 maneiras de NÃO utilizar a tecnologia em sala de aula. Esta lista baseia-se em minha experiência de 13 anos como professor de química, quando usei intensamente a tecnologia em sala de aula e, depois, como gestor de projetos de tecnologia educacional implantados em cerca de 40 escolas no Brasil. Durante essa jornada, errei muito, mas esses mesmos erros me levaram a acertos incríveis, que tornaram o uso da tecnologia extremamente significativo.

1. NÃO utilize a tecnologia apenas como substituta de livros ou apostilas

Quando se propõem a utilizar dispositivos móveis (tablets e smartphones), a primeira coisa que MUITAS escolas fazem é digitalizar os livros e apostilas — geralmente para o formato PDF — e embarcá-los dentro dos dispositivos. Embora alguns até apontem ganhos nessa substituição, tais como redução de peso em papel para carregar ou acesso a algumas ferramentas de edição (marcadores de página, grifadores de texto etc.), a verdade é que esse processo pouco agrega à aprendizagem dos alunos. Já vi alunos abandonando os dispositivos pouco tempo depois de iniciarem o uso nas escolas, pois estes eram destinados apenas a essa finalidade.

2. NÃO utilize a tecnologia para reproduzir ações que são melhor executadas sem a tecnologia

Escrever à mão é o melhor exemplo para este tópico. Ainda não surgiu tecnologia acessível em dispositivos móveis capaz de entregar a mesma experiência da escrita em papel, a ponto de substituí-la. Os apps que se propõem a servir de cadernos digitais para escrita à mão contam ainda com inúmeros inconvenientes. Letra feia, delay na resposta, telas pequenas ou lisas demais e necessidades de canetas específicas são alguns dos motivos pelos quais o bom e velho papel ainda é a melhor alternativa para a escrita à mão.

Podemos citar aqui também o uso das lousas digitais. Elas devem ser utilizadas para algo além da lousa convencional. Exibição de vídeos e modelos 3D, desenhos de formas geométricas com rapidez e perfeição e usos de programas e simuladores específicos são alguns dos motivos pelos quais vale a pena ter uma lousa desse tipo. Utilizá-la apenas para escrita é um “tiro no pé”. Um dia a lousa vai estar descalibrada ou o projetor vai estar com a imagem pixelada, e lá se vai um tempão da aula para tentar solucionar o problema. O melhor é ter na sala de aula aquele modelo híbrido de lousa digital e de pincel ao mesmo tempo.

3. NÃO utilize a tecnologia apenas para melhorar a exposição do conteúdo

Essa é maior barreira a ser vencida por nós professores. A primeira ideia que nos vem à mente, sempre que decidimos utilizar tecnologia, é levar para sala de aula recursos que vão nos ajudar a explicar conceitos com maior clareza na lousa digital e projetores, ou dar exemplos visualmente mais impactantes. Não há problema nenhum nisso. A questão é achar que só isso basta.

Em 2010, pesquisadores do MIT publicaram um artigo referente a um teste com um novo dispositivo construído para medir a atividade eletrodérmica em seres humanos. Essa medida, muito usada em pesquisas de neurociência, dá informações indiretas sobre o estado de excitação emocional da pessoa. O interessante nesse artigo foi a publicação de um gráfico em que a atividade eletrodérmica dos indivíduos que se submeteram aos testes com o novo dispositivo foi medida durante 7 dias. Repare que essa atividade é praticamente nula em duas situações: quando os indivíduos assistem à TV ou quando eles assistem às aulas!

Por melhores que sejam os recursos utilizados para exposição de conteúdos em aula, eles não vão gerar uma postura ativa por parte dos alunos. Há um outro nível de uso de tecnologias que, associadas àquelas destinadas à exposição, trarão o aluno para uma postura ativa e, portanto, de maior resposta emocional. Plataformas LMS (learning management system) e aplicativos como nearpod proporcionam a interação com os alunos mesmo em aulas mais expositivas.

4. NÃO utilize tecnologias que coloquem o professor à margem do processo

O mercado de EdTech (apelido gringo para Tecnologias Educacionais) está extremamente aquecido no Brasil e no mundo. O problema é que muitas startups estão desenhando soluções que não preveem a participação ou interferência do professor no processo. Resultado: escolas que adotam tais soluções têm se queixado do baixo engajamento dos alunos nessas plataformas, abandonando-as ao final do primeiro ano de contrato.

O professor é a peça-chave no sucesso da adoção de qualquer nova tecnologia educacional. Soluções desenhadas de forma a oferecer ao professor ambientes e ferramentas para que ele se torne um designer de experiências educacionais para seus alunos terão MUITO mais chances de sucesso do que outras que coloquem o professor como simples operador ou o deixem completamente de fora do processo.

5. NÃO utilize tecnologias que não tragam dados analíticos sobre os alunos, individualmente

“Eu acho que meus alunos compreenderam bem este ponto, então vou avançar com matéria…”

“Eu sinto que preciso retomar tal conteúdo porque parece que meus alunos ainda não entenderam isto…”

Durante muito tempo, nós, educadores, baseamos nossas ações pedagógicas em nosso próprio feeling. Algumas medidas mais precisas a respeito do desempenho dos alunos são obtidas por meio de provas e avaliações, que ocorrem de tempos em tempos. Mas, e nos intervalos entre as avaliações? Conseguimos acompanhar diariamente o progresso no aprendizado dos alunos e tomar decisões sobre a nossa forma de trabalho em sala de aula? Ou “tocamos o barco” e esperamos o próximo mês ou bimestre (tempo que pode gerar enormes lacunas de aprendizado) para aferir o conhecimento dos alunos em nova avaliação?

Usando tecnologia — desde que a escolha das ferramentas seja acertada — é possível medir todas as interações dos alunos com as plataformas e gerar uma enorme massa de dados. Essa massa, denominada Big Data, pode dar origem a gráficos e relatórios analíticos precisos sobre cada um dos alunos e seu desempenho pontual em determinado conteúdo a qualquer tempo. Com isso em mãos, os professores poderão tomar decisões rápidas e certeiras sobre quais ações e estratégias pedagógicas adotar, agora embasados em dados e não apenas em sentimentos.

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